domingo, 26 de agosto de 2012

A vida alheia



Todos nós já vivemos alguma situação em que queríamos poder apertar o botão “pular”, e passar para a próxima fase. Os problemas adquirem as mais variadas formas: pode ser uma separação, a morte de alguém querido, uma doença, ou nada tão grave assim, mas que acaba machucando a gente. O fato de ser banal ou de ter uma escolha óbvia para os outros, não quer dizer que seja igual pra você, porque cada um foi criado de uma forma, tem traços de personalidade diferentes, cultivou alegrias e traumas diferentes e, juntando tudo, tornou-se quem é. Por isso, não dá pra julgar as pessoas num contexto genérico. Eu sei que a gente julga, eu sei que, de vez em quando (ou de vez em sempre), a gente se pega criticando o modo de agir de um parente, de um amigo ou de um vizinho. E quando para pra pensar, se dá conta de que dar palpite na vida dos outros é muito fácil, difícil é administrar a própria vida.

Quem nunca chamou a personagem da novela de trouxa e disse que no seu lugar já teria deixado o marido ou expulsado o filho de casa há muito tempo?E quem é que nunca falou com todas as letras que ja-mais perdoaria a amiga que teve um caso com o seu ex?E mais: quem não abriu a boca pra dizer que nunca aceitaria como mãe a mulher que esconde, com vergonha, o seu passado?Acontece que falar é uma coisa e fazer, considerando toda uma história de vida é outra bem diferente. Estar envolvido na situação é como mergulhar, faz a gente enxergar um outro mundo,que não pode ser visto pelo lado de fora. Não deve ser fácil jogar no mundo um ser formado em seu próprio ventre, a quem você, por longos nove meses (e inúmeros depois), dedicou tanto amor e carinho. Não deve ser fácil acabar com o sonho imaginado por toda uma vida e um dia, enfim, concretizado diante do altar. Não tem número que expresse o monte de possibilidades que passam pela cabeça de uma pessoa que precisa tomar uma decisão importante para ela. E não tem uma tecla no coração pra apertar e acabar com o amor.

A gente tenta resolver os problemas do jeito que acha certo e digno e, às vezes, até conseguimos nos transformar em uma espécie de robôs, indiferentes a tudo. Mas, uma hora a bateria vai acabando e a gente não pode se culpar por nem sempre conseguir estar por cima da carne seca. Ser humano é ter sentimento, que a gente não escolhe, feliz ou infelizmente. Ser humano é ser limitado. E é mais justo com você respeitar o seu limite, até estar confiante para dar um passo a mais.

Se a mãe não abandonou o filho, se a esposa perdoou o marido ou se a ex-amiga é amiga de novo, é exclusivamente da conta deles. É claro que cada um tem a sua opinião, mas é melhor guardá-la para uso próprio. Se o outro está feliz com a opção que ele fez, se não está se prejudicando, cada um que fique na sua. O que mais tem é gente achando que a vida dos outros é uma espécie de “Você decide”(aquele programa em que o telespectador decidia o fim do capítulo), e quando chega a sua vez de protagonizar a trama, escolhe um final igual ou pior. Só quem vive um conflito sabe cada detalhe da história, desde o início, e sabe dizer exatamente cada motivo que possui para falar sim ou não. Cada um que considere ou desconsidere suas razões e seus sentimentos. Afinal, como todo mundo que já leu uma frase em vidro traseiro de carro sabe: “Deus deu a vida pra cada um cuidar da sua”.

domingo, 19 de agosto de 2012

O espelho



De tempos em tempos, a vida nos reserva um encontro conosco. Coloca-nos frente a frente com a gente mesmo, obrigando-nos a questionar sobre os caminhos que temos percorrido. Olhar para si não é tarefa fácil, pois se trata de assistir à única história da qual você é o personagem principal. E mais que isso, e um tanto quanto doloroso, trata-se de confrontar os sonhos com a realidade.

E o que é a realidade se não uma combinação das linhas escritas pelo destino com as nossas escolhas?Escolher significa arriscar. É estar diante de dois caminhos que não passam pelo mesmo trajeto, e que, portanto, reservam alegrias e dissabores diferentes. Talvez, algumas vezes compartilhem o mesmo fim; é natural que haja mais de uma rota para o mesmo lugar. Mas, a estrada que molda os pés que a percorrem, imprimindo-lhes as marcas dos espinhos que adentraram na carne ou da poeira levantada pelos passos, das sandálias recebidas em uma das pausas feitas, de porta em porta, para aliviar o cansaço da jornada, ou da água da chuva, que lhes ofereceu vida nova depois das amarguras vividas em terras áridas, jamais será reproduzida em outras bandas. Cada caminho nos aguarda com descobertas ímpares e, vez ou outra, permite-nos avistar um retorno.

Olhar para o espelho da própria alma exige que ela seja forte. Assumir as mazelas que permeam a frágil existência humana pede a coragem que não tivemos ao escrever os capítulos da nossa história. Adentrar em um mundo a que só nós temos acesso, mas que, por medo de abraçar nossos erros e omissões, cotidianamente trancamos a sete chaves, é despertar fantasmas que nos assombram sem compaixão e, ao mesmo tempo, descobrir armas para derrotá-los, pois ambos são frutos cultivados dentro de nós. Quem conhece o princípio ativo do veneno sabe como produzir o antídoto.

A efemeridade da vida e a impiedade do tempo, que arrasta consigo tudo o que vê pela frente, sem conceder exceções que permitam demorar-se um pouco mais, conseguem destruir esperanças e fazer caírem lágrimas de olhos que refletem o medo de quem toma, em seus frágeis braços humanos, os conflitos que vêm lhe afligir, e reveste-os de um imediatismo incompatível com o florescer das respostas.Às vezes, o corpo reflete o clamor da alma por remédios que ela mesma desconhece.Em cada novo dia existe uma nova possibilidade, e em cada amanhecer um novo raio de sol, que renova os ânimos de quem, ainda que por um breve momento, cruzou os muros construídos em seu interior para separar a emoção dos territórios racionais.

Os lábios apenas tratam de exteriorizar a paz que enche o coração quando o medo não paralisa a vontade de conhecer novos terrenos, pois só quem se permite tentar outra vez consegue voltar a sorrir. O tempo é o carrasco de muita gente, algoz de todos aqueles que, por um ou outro motivo, esqueceram sua vida e trocaram-na pelo simples ato de existir. Por isso, observar o próprio reflexo é uma chance de se encontrar em novos rumos. A vida é uma só, mas as oportunidades são inúmeras e passam por nós todos os dias. O tempo também passa, e sem que a gente se dê conta do quanto ele é veloz e pode nos aprisionar em existências sofridas quando não lhe oferecemos reação. Para quem decide acreditar e agir, sempre é tempo de recomeçar.

domingo, 12 de agosto de 2012

Tudo tem seu preço



Agora tenho certeza de algo que já sabia há tempos, mas não queria aceitar, já que a gente sempre quer encontrar o meio mais fácil de resolver as coisas. Compreendi que, o tempo todo, o que a vida requer é coragem. Sei que isso soa bem clichê, que em cada esquina vai ter alguém falando exatamente a mesma coisa. Mas, quer saber? Quem foi que disse que o que é clichê não é verdade?

Quando crescemos, entendemos que tem coisa que é certa, e tem coisa que é errada. E tem coisa que é o melhor a ser feito num determinado momento. Você sabe que é melhor não usar drogas, não deixar de estudar, não tomar sol sem protetor solar e não brincar com os sentimentos das pessoas. Nem sempre é isso que você vai fazer, mas a questão é que você sabia o que devia ter feito.

O negócio é que a gente tem medo de perder. Tem medo de jogar tudo pro alto e não conseguir construir uma história melhor. Precisamos guardar muito bem na cabeça que ganhar também implica em perder. Existem coisas que são incompatíveis e, por isso, não podem coexistir. Então, chega a hora de abrir mão de alguma delas. Só quem arrisca “corre o risco” de chegar aonde quer, porque não existe sonho que venha correndo até você pra se realizar e te realizar.
  
A vida não é jogo de duas escolhas. Ou a gente quer ou não quer. Ou vai ou racha. É sim ou não, e nada de meio termo. Mas, quando os problemas vêm, chegam acompanhados por uma infinidade de hipóteses que ficam o dia todo, perambulando pelo pensamento, como se tivessem feito uma lavagem cerebral antirraciocínio, para que você, nem de longe, consiga organizar as ideias.

É mesmo meio avesso não saber o que vai acontecer no futuro e, ainda assim, ter que fazer uma escolha. Primeiro, vem a atitude; depois a resposta que esclarece as dúvidas. Resposta que representa a recompensa pra quem teve a coragem de arriscar o que tinha nas mãos por algo a mais. Não é a toa que decisão, no dicionário, é definida como coragem.

Para enfrentar os problemas, não é necessário estar pronto para encarar as consequências, pois estar disposto já inicia a preparação. Nada é tão maravilhoso como a gente sempre quis, mas, descobrindo os benefícios por trás do que parecia só possuir lado ruim, passamos a entender que nada precisa ser perfeito para que seja bonito. Sem coragem não existe vitória, porque a vida só oferece êxito pra quem, antes, aceitou pagar o preço caso nada desse certo.


domingo, 5 de agosto de 2012

A outra face do poder



Começou esta semana, em Brasília, o julgamento do chamado “Mensalão.” Sete anos após a descoberta do esquema de corrupção, o Supremo Tribunal Federal vai julgar, de uma só vez, 38 réus acusados de terem cometido diversos crimes, como corrupção ativa, lavagem de dinheiro e formação de quadrilha.

Em entrevista a um jornal da televisão aberta brasileira, um cientista político, opinou sobre o assunto, dizendo que ainda que todos os réus sejam absolvidos, a sociedade brasileira não verá a impunidade prevalecer mais uma vez, levando-se em conta que irá ocorrer o julgamento do caso.


O Brasil é um Estado Democrático de Direito e, como tal, vigora o que é decidido pela maioria, sob a égide de um ordenamento jurídico. Pelo princípio da presunção de não culpabilidade, ninguém é considerado culpado até que se prove o contrário e, sob o amparo do Código de Processo Penal Brasileiro, o réu deverá ser absolvido nos casos em que não existam provas de autoria do fato delituoso. Reportando-nos à fala do cientista político e pautando-se na legislação brasileira, provando-se inocentes os réus ou não se obtendo prova de culpa, é de se concordar que a justiça tenha sido feita. Creio que o cientista político quis dizer que levar um caso de escândalo público a julgamento já é uma vitória para o povo brasileiro, que tantas vezes viu a injustiça levar a melhor.


O questionamento que faço é o seguinte: tendo o caso vindo à tona e revoltado toda a população, ao ver que sua democracia não era assim tão democrática, como agora será possível convencê-la de que nada existiu?É fato que as leis deixam brechas e que, por meio de manobras bem pensadas, acaba sendo possível conseguir uma absolvição. Mas, em um caso de tão grande repercussão e com tantas evidências levadas a público, livrá-los de uma condenação corresponderia a colocar a inteligência da nação em um patamar ínfimo, e ainda confirmar que a seriedade do país só existe no papel, em que também figuram a justiça, a igualdade e a democracia.


O que falta para a “pátria amada” é o cumprimento, por todos, de suas leis, inclusive pelos governantes, que nada mais deveriam ser que representantes da real vontade popular. Se o próprio governo ensina corrupção, não há como esperar que predomine o que é honesto pelas ruas do país. Se as pessoas veem que os ideais de equidade pregados nunca são efetivamente cumpridos e tornaram-se apenas uma forma de calar sua voz, acabam por desacreditar no compromisso do Estado. O povo precisa entender que, como bem dizem, mais importante que a velocidade, é a direção. Nenhuma mudança acontece de uma hora para a outra, mas tudo começa com o primeiro passo. O povo brasileiro está precisando mostrar a sua cara, pois quem não assume a identidade que lhe pertence, deixando de buscar o que lhe é de direito, e esquece a importância de escolher seus políticos com responsabilidade, sempre vai acabar fazendo papel de palhaço.